Classificação de Bens Imóveis – Envio de sugestões a Ministério da Cultura e Património Cultural, IP (04.09.2024)

Ex.ma. Senhora Ministra da Cultura
Dra. Dalila Rodrigues,
Ex.mo. Senhor Presidente do Património Cultural, IP
Dr. João Soalheiro
cc. media
Como é do conhecimento de V. Exas. a classificação de Interesse Público não tem sido o garante da salvaguarda dos bens classificados que seria esperado e desejado pelo legislador, em grande parte, mas não só, porque do lado dos proprietários não existe sensibilização nem motivação para que isso aconteça, havendo mesmo casos em que a classificação é entendida apenas como um obstáculo à livre iniciativa, um espartilho à propriedade privada, pelo que pretendemos com esta iniciativa contribuir para melhor se atingir esse desiderato.
De facto, e infelizmente, vários têm sido os exemplos em que os proprietários derrubam paredes, tectos e estuque, arrancam coberturas e soalhos, destroem elementos decorativos, alteram volumetrias, esventram o subsolo, substituem materiais, obstruem o bem classificado, abandonando-o inclusivamente à incúria, etc., grande parte das vezes também por falta de conhecimento das próprias equipes técnicas e muitas vezes com a melhor boa vontade. 
Obras ilegais, algumas vezes, sem que sejam sequer comunicadas à tutela, que desvalorizam e desvirtuam o bem classificado, pondo em causa essa mesma classificação em alguns dos casos verificados, e, mais grave, estão a destruir o nosso património cultural e a destruir a nossa identidade. Uma prática que não é de agora mas que se tem agravado nos últimos anos.
Existe um divórcio, por vezes litigioso, entre o proprietário do bem classificado e a tutela, para lá do desconhecimento do que essa classificação comporta – veja-se a este propósito dois casos de que demos conta a V. Exas. recentemente: a substituição de uma porta em ferro por uma em PVC no quarteirão Em Vias de Classificação da Av. Duque d’Ávila, e o roubo e destruição de um gradeamento em ferro, Arte Nova, no Palacete Valmor, classificado de Interesse Público.
Pensamos que para tal em muito contribui a escassa relevância que uma eventual isenção de IMI tem para o proprietário, enquanto incentivo financeiro, mas, mais importante, a inexistência de incentivos de outra ordem, bem como outros factores, desde logo a falta de sensibilização para a causa, a falta de informação sobre o estatuto de “interesse público”, mas também o não reconhecimento pela comunidade e pelo próprio proprietário sobre o que é ser um bem classificado. 
Acima de tudo deve ser um grande orgulho ter-se um imóvel classificado, deve ser encarado como um selo de qualidade, que inclusivamente valorize em mercado o imóvel como acontece por exemplo com a classificação dos veículos clássicos.
Este exemplo de veículo clássico tem, aliás, vários bons exemplos que podem ser transpostos para os imóveis:
-A vantagem inicial para os proprietários que é a inspecção ter uma periodicidade muito mais longa e poder ter a equivalência da isenção de IMI.
-Mas como se mantém a inspecção, pode perder a classificação, pelo que poderia ser importante nos imóveis a classificação poder ser reavaliada periodicamente, mas o retirar da classificação tem de ser mau para o proprietário.
-Nos veículos a classificação corresponde a um significativo aumento do valor comercial.
-No caso de um acidente as seguradoras não podem dar o veículo como perda total, isto é provavelmente a maior vantagem nos veículos classificados, provavelmente nos imóveis deveria acontecer algo semelhante.
-Também os seguros dum veículo classificado são significativamente mais baratos.
-Existem grandes comunidades de interajuda de proprietários.
Assim, sugerimos a V. Exas. que desenvolvam esforços no sentido de serem criados nesta legislatura alguns mecanismos, alguns com custos muito baixos, que ajudem a uma mudança efectiva de paradigma, poderão passar pela, 
 -Criação de uma estrutura nos serviços do Património Cultural, IP, em figurino de “gabinete de apoio”, em que, permanentemente, se garanta a ligação tutela-proprietários dos bens classificados, onde estes possam obter a informação e o apoio técnico necessários em matéria de boas-práticas, aconselhamento técnico e jurídico, etc. De modo a que seja visto como um verdadeiro apoio e nunca como o “polícia mau” que vai atrasar, dificultar, tornar mais caros os trabalhos, porque pode ser o contrário, e ser a justificação para a não aplicação de alguns regulamentos; limites de dimensões; eficiência energética.
 -Criação pelo Património Cultural, IP, de um canal de comunicação de urgência para os proprietários para situações de emergência: acidentes no imóvel, incêndios, abatimento de terras ou cobertura, necessidade de travar obras na zona de prospecção, etc.
 -Organização pelo MC/PC-IP de 1-2 reuniões/colóquios por ano, em que se reúnam e se auscultam os proprietários dos bens classificados, se divulgam as boas e más-práticas, auscultam especialistas das várias áreas relacionadas com a salvaguarda do bem, mas também sobre a sua boa manutenção e a sua utilização apropriada.
-Sensibilização para a necessidade de divulgação do bem classificado junto do público, como forma de se alcançar um maior reconhecimento público do bem em causa, com recurso à edição de publicações e a parcerias com outras entidades que lhe permitam outra escala. 
-Criação de um diploma de imóvel classificado, com placa a ser, ou não, colocada no Imóvel.
-Atribuição de incentivos não financeiros aos proprietários, por exemplo prémios/menção honrosa anuais à “melhor manutenção”, à “melhor intervenção de restauro”, à “melhor utilização de um edifício classificado”, à “melhor divulgação”, etc.
-Perda de isenção de IMI e outras penalizações para os proprietários de imóveis classificados em claro estado de abandono/incúria.
 -Notificação dos proprietários dos trabalhos que vão ser feitos na zona de protecção do imóvel, pois aqueles podem ser “fiscais” de boa vontade.
-Isenção de AIMI no caso em que os proprietários são empresas, casos que não são raros.
 São apenas ideias, mas que cremos poderem servir de guião inicial à urgente mudança de paradigma, para que do lado do proprietário se encare a tutela e, sobretudo, a chancela de “interesse próprio” e não só de “interesse público” não como um galardão que apenas é um empecilho, onera e castra quem possui o bem classificado, mas que, em vez disso, o incentiva, premeia e apoia.
Conjuntamente, a tutela deveria estar em permanente sintonia com as boas-práticas que sobre este tema são praticadas noutros países.
Na expectativa, apresentamos os melhores cumprimentos
Paulo Ferrero, Bernardo Ferreira de Carvalho, Miguel de Sepúlveda Velloso, António Araújo, Rui Martins, Pedro Jordão, Nuno Caiado, Helena Espvall, Gustavo da Cunha, Filipe Teixeira, António Miranda, Manuela Correia

Leave a Reply

Your email address will not be published.